domingo, 1 de novembro de 2009

Capítulo 10



Eles me chamaram para a mesa. Mesfistófeles e um velho estranho. Eu estava numa espécie de plataforma naturalmente formada e sem um pilar fundamental. A plataforma flutuava. Havia um caminho de pedra. A mesma pedra que constituía a aparência da plataforma. Eram meio sujas. É como todo o solo do inferno parece. Tentei cruzar o caminho de pedra e ele se tornou uma ponte de madeira que se movia formando ondas enormes que deveriam me lançar a metros de altura. Sem me assustar, continuei até que tudo isso sumiu e eu estava andando pelo caminho. Cheguei à mesa.

-    Tão brincando com a minha mente?
-    É.
-    O que vocês querem fazer?
-    Para de fazer pergunta besta. Você sabe muito bem. Agora vamos jogar cartas.

Jogamos cartas. Eu passei para o velho, ele passou para Mefistófeles e ele pra mim.
Acordei Com uma rajada de ak-47.

-    Que porra foi essa? – perguntei.
-    To testando pra ver se tem zumbis aí. Tem uma casa e parece que vai vir uma tempestade. Além disso, com esse combustível nós não vamos muito longe. Precisamos de comida e isso que esse moleque aqui tinha na mochila não vai durar nem dois dias. – respondeu o sargento.

O cara novo, Felipe, não tinha falado uma palavra desde que saímos com o barco, há quase cinco horas. Só fica olhando pra água. Fiquei surpreso ao notar como ele é mirrado de perto e ainda assim conseguiu matar três monstros sozinho, sem armas de fogo.
Um soldado saiu do meio da floresta. Acenou para não atirarmos, mas foi atingido na perna por trás. Levamos o barco até uma pequena ilha e o colocamos atrás dela, de forma que quem quer que tenha atirado nele não pudesse nos ver. Dava pra vê-los da ilha, quando desembarcamos. Surgiram dois soldados americanos. Sargento os diferenciou pela diferença nos uniformes. Um terceiro veio correndo e gritou.

-    Jumper!

Os dois entraram imediatamente em pânico, buscando algum lugar para se esconder. Nunca vi uma cena como aquela em toda a minha vida. Um homem de terno saltava de arvore em arvore e se segurava com facilidade. Ele não fazia barulho como os outros monstros.

-    There, shoot him!

Os soldados o avistaram e começaram a atirar, mas ele se esquivava rápido. Alcançou o terceiro soldado que vinha correndo e o usou como escudo humano contra os tiros. Deu uma mordida na nuca do soldado ferido e saltou para a parte superior das arvores. Ali havia muitas folhas e a visibilidade ficava comprometida. Os soldados o perderam de vista e depois de alguns segundos eu pude ouvir ao longe um som de helicóptero. Os soldados colocaram as mãos no ouvido. Pareciam estar se comunicando com alguém. Talvez com o helicóptero. Ele veio até a pequena praia onde estavam.
O helicóptero não tinha onde pousar, então soltou uma escada na praia e eles se seguraram nela. Eram bem fortes, pois começaram a escalar sem usar as pernas. Talvez seja a força do medo.
O homem de terno deu um salto de uma das arvores e se pendurou no helicóptero. Ele aprecia saber muito bem o que estava fazendo. Entrou no helicóptero que tinha dois homens, nocauteou um com uma cotovelada e mordeu o pescoço do piloto. Depois disso ele pulou do helicóptero até o chão e cheirou o corpo do soldado baleado. O soldado ainda estava vivo, mas ele não o atacou. Simplesmente saltou e foi embora. O helicóptero caiu numa pedra e explodiu.

-    Temos que ajudá-lo! – disse Isabela
-    Ta maluca? – disse Felipe – se a gente for ali aquela coisa vai nos matar a todos sem dificuldade!
-    Ele só levou um tiro na perna, pode sobreviver. Temos que ajudá-lo.
-    Porra nenhuma! Não vou morrer porque você quer dar uma de heroína. Se quiser vai sozinha.

Augusto e o sargento olharam pra mim. Nós nos comunicamos pelo olhar. Fomos para o barco.

-    Pode esperar aqui. Se não for perigoso para a nossa sobrevivência nós voltamos pra te buscar. – disse o soldado.

Felipe entrou no barco e não falou mais por um bom tempo. Isabela levou o barco até a praia e descemos até o ponto onde o soldado estava deitado. O sangue escorria pela areia até a água.

-    Ta tudo bem. Nós vamos te ajudar. – disse eu.
-    Não. Não vão. Perdi muito sangue e precisaria de um hospital imediatamente.
-    Nós não vamos te deixar aqui. – Disse Isabela
-    Não vou discutir com você. Ouçam. Cuidado com o mar.
-    Tem monstros marinhos? – perguntou Felipe.
-    Sim. Humanos, com barcos de guerra. Eles estão destruindo barcos civis.
-    Imaginei. – falou Felipe num tom triste e irônico ao mesmo tempo.
-    Os barcos brasileiros não estão em funcionamento. Esse helicóptero é um dos últimos dos americanos. Estão indo embora por questões de defesa nacional. Isso que os soldados falaram aqui agora a pouco.
-    Caralho! Como vamos sair daqui agora se não há helicópteros? – disse Augusto.
-    Achava que esses helicópteros aceitariam vocês? A única maneira de escapar é através dos vôos a ONU. Soube que ainda sairão mais dois aviões
-    Porra, o tempo ta acabando. – disse o sargento.
-    Mas vocês terão que esperar mais oito horas. É a hora em que o ultimo navio americano sairá. Até lá eles podem destruir vocês.
-    Não fala assim. – disse Isabela num tom pesaroso. – diga nós. Você também vem.
Uma lagrima escorreu pelo rosto do soldado, que puxou uma pistola e apontou pra ela.

-    Já estou tremendo e com frio. Não vou sobreviver. Não posso ser um fardo.

Isabela deu três passos para trás. Estava com os olhos cheios de água. Sabia que ele estava certo, mas não queria aceitar. Eu também sentia isso, e percebi que os outros tinham a mesma expressão no rosto.
O homem de terno voltou e caiu de pé na frente de Isabela, que caiu sentada no chão. Senti um pavor indescritível ao olhar para ele. Ele não tinha ódio no olhar. Não tinha nada no olhar. Felipe correu em direção a ele como que num impulso e tentou golpeá-lo com duas facas, mas ele se esquivou com uma facilidade assombrosa. Com uma cotovelada nocauteou o agressor e nos fitou atento. Sargento começou a atirar, ao que o homem de terno pulou para o tronco de uma arvore. Ele ia de uma à outra com muita rapidez e era mesmo difícil saber se algum tiro o acertava. O som atraiu outros monstros. Berravam como o normal. Carregamos Felipe para o barco e quando voltamos o soldado ferido estava de olhos fechados. Talvez estivesse desmaiado. Desci do barco para pegá-lo, mas vi os monstros chegando. Sargento, Augusto e o outro soldado também desceram. Empurramos o barco e subimos por uma escada na lateral.
Os monstros pararam diante da água e ficaram berrando. Parece que não sabem nadar.
Isabela levou o barco para perto da ilha, ao que o soldado protestou.

-    Ô retardada. Ta fazendo o que? Bora pro sul porra!
-    Retardada é o caralho, maluco.- respondi. – se a gente sair agora os americanos vão nos destruir.
-    Deixa de ser idiota, moleque. Eles estão se preparando pra sair. Não vão perder tempo atirando na gente. Nem vão nos perceber, se duvidar.
-    Eles têm radares e nada a perder. É arriscado demais.
-    Sabe por que eu não vou discutir com você?
-    Você já está discutindo comigo.
-    Você é um tremendo babaca. Pelo jeito maluco não é, então só pode ser uma tremendo babaca.
-    Por quê?
-    Você por acaso sabe meu nome?
-    Não.
-    Viu? Sabe por quê? Porque até hoje você não dirigiu uma palavra pra mim e nem pro Rodolfo. O cara morreu e você nem sabe o nome dele! Você acha o que, que soldado é figurante? Vai tomar no cu, cara.

Fiquei em silêncio. O que eu poderia dizer?
Felipe acordou num pulo e pegou um facão, como que se preparando pra lutar.

-    Calma aí, maluco. – disse Augusto.

Felipe voltou a deitar. Estava ofegante e parecia um pouco zonzo.

-    A gente vai esperar.
-    Acho que sim. – respondeu Isabela. – Escuta, valeu por me salvar. Aquele monstro teria me matado se não fosse por você.
-    Pensa que eu fiz porque me importo? Olha, moça, eu só tentei te defender porque você é quem pilota o barco. Sem você estaríamos a pé.
-    Não. Isso não é verdade - disse eu.
-    Que, ta lendo minha mente agora, ô grandão?
-    Não. Você foi muito rápido. Não pensou, só agiu. Se tivesse parado pra considerar o que você ta dizendo, a Isabela estaria morta.
-    Esse cara é sempre um babaca metido a sabe-tudo? – perguntou ele aos outros.
-    Aprendeu rápido. – respondeu o soldado.
-    Qual é o seu nome? – perguntou Felipe
-    É Rodrigo. - disse ele depois de olhar pra mim agressivamente.
-    Cara, eu só tava tentando te dizer que você foi um herói. Eu amo a Isabela e vou ser grato a você pra sempre.

Isabela ficou vermelha feito tomate, e todos ficarem em silêncio. Falei sem pensar. Também fiquei um pouco envergonhado, mas minha pele não me acusou porque sou moreno. Se eu falei por impulso é porque, no fundo, isso estava dentro de mim. Nada surge na nossa mente do nada.

-    É. Ele é apaixonadinho pela puta. Matou um amigo meu, essa vadia. Todo mundo aqui já comeu ela.

Pulei em cima de Rodrigo e dei-lhe um soco na cara. Ele caiu e caí em cima dele, mas ele fez alguma coisa que não entendi bem e acabou me virando. Acertou três socos na minha cara. Augusto o segurou e eu fiquei deitado. Meio tonto, com a sombrancelha sangrando.

-    Porra, se a gente ficar brigando assim o grupo se auto-destroi. Eles são so inimigos, porra! – disse o sargento apontando para os zumbis na praia.
-    Esse maluco é um covarde de merda. Babaca. – disse eu.
-    Soldado, eu pensei que concordamos em não falar mais disso. O senhor tem algum problema mental?
-    Eu não participei daquela covardia. – Disse Augusto.
-    Esse babaca fica nervosinho, mas ele também participou. – disse Rodrigo.

Apontei uma pistola pra ele e ele apontou um fuzil pra mim. Isabela segurou a arma na minha mão.

-    Eu perdoei eles, Roberto. Isso já não me faz mal. Para com isso.
-    Como conseguiu? – disse eu antes de soltar a arma na mão dela.
-    Sua pergunta deveria se inverter. Como eu poderia viver sem ter perdoado o que eles fizeram? Como suportaria o fardo do rancor dentro de mim?

Ficamos todos em silêncio. Rodrigo foi para a parte da frente do barco. Parecia um pouco transtornado.

-    Ei, Felipe. – disse o sargento
-    Fala.
-    Quando o soldado disse que os americanos estavam destruindo barcos civis, porque você disse que já imaginava isso?
-    Minha família não foi morta por monstros. Eles foram fuzilados por soldados que sabiam que eles não estavam infectados. Eles não parecem querer correr riscos.

Anoiteceu...

2 comentários:

Duan Conrado Castro disse...

revisão ortográfica

que esse moleque aqui tinha ma mochila
Não võ perder tempo atirando na gente.

Silas disse...

Capítulo revisto e erros verificados.

Valeu, cara...